quarta-feira, 14 de setembro de 2011

(Re)Fazendo História

Tem uma coisa que me incomoda muito quando leio uma resenha ou crítica de um filme: a falta de informação de quem escreveu. Principalmente quando essa falta de informação leva a conclusões erradas e opiniões mais erradas ainda. E ainda mais atualmente, quando não é exatamente difícil se conseguir informação sobre praticamente qualquer assunto.
Para ilustrar isso, eu vou citar um exemplo. Melhor, dois exemplos num mesmo tópico: remakes.
Eu cansei de ouvir que “Hollywood hoje só pensa em fazer remakes” ou que a “moda hoje em dia é fazer remakes de qualquer coisa”, e pra completar essa eventual revolta (e talvez justificá-la), aparece a frase de que “eles estão sem criatividade para fazer filmes novos” ou algo parecido com isso.
Muita gente parece associar remakes com sinônimo de filmes ruins ou que não merecem ser vistos (afinal, o original é sempre muuuuuito melhor), com caça-níqueis feitos apenas para arrancar dinheiro dos espectadores, ou até mesmo um desrespeito com grandes obras, grandes diretores etc. E também com uma "moda" recente. Na verdade, a coisa não é bem assim.
Peter Lorre na primeira versão de
O Homem que Sabia Demais, de 1934
Fico surpreso como não se percebe (ou se esquece) que grandes filmes da história do cinema eram remakes. Grandes diretores fizeram suas próprias versões e interpretações de outros filmes e foram aclamados por isso. Aliás, o teatro sempre faz “remakes” de peças clássicas, e isso não parece incomodar os críticos e os pretensos entendidos.
Por exemplo, Alfred Hitchcock filmou O Homem que Sabia Demais em 1934, mas decidiu refazer o próprio filme em 1954, numa versão que ficou mais famosa, com James Stewart e Doris Day. Ainda ficando em Hitchcock, Disque M para Matar (1954) também é uma versão da mesma história, que já tinha sido feita em 1952.
Outro filme pouco lembrado como sendo um remake é o clássico da Ficção Científica Enigma do Outro Mundo (The Thing, 1982) de John Carpenter, que já tinha surgido como O Monstro do Ártico (The Thing, 1952). O filme de Carpenter é considerado um dos marcos da ficção/terror, uma verdadeira jóia criativa que envelheceu muito bem, podendo facilmente assustar platéias atuais (e o qual terá uma nova versão - um prequel, na verdade - em breve).
E que tal remakes triplos? O filme (fraquinho) A Casa de Cera (House of Wax, 2005) é uma versão de Museu de Cera (House of Wax, 1953), que por sua vez também é um remake de Os Crimes do Museu (Mystery of the Wax Museum, 1933)!

Enigma de Outro Mundo (1982) - um filme irretocável que -
olha que surpresa! - é uma refilmagem.
Se for pra ficar enumerando remakes, a lista é gigantesca, e com várias surpresas para o fã incauto de cinema. A questão aqui é não dizer qual filme é ou não uma versão desse ou daquele outro filme, mas mostrar que essa prática não é uma moda atual, e que não é de hoje que Hollywood reutiliza histórias. O cinema herdou muitas práticas do teatro, modificando-as para melhor se adequar a sua própria linguagem, então não é de se surpreender que a ideia de refazer uma história ou dar uma nova versão a ela seja tão comum e esteja presente em toda a história do cinema.
E como dá pra perceber pelos títulos que citei, nem todos os remakes são ruins, carecem de criatividade e são versões pioradas de algum clássico muito melhor. Em alguns casos, o remake é muito melhor e acabou ficando muito mais famoso e marcante do que o original. Poxa vida, Alfred Hitchcock achou que valia a pena refazer um filme dele!
Os critérios pra se avaliar um remake devem ser os mesmos utilizados para qualquer outro filme, e não se deixar levar por preconceitos bobos do tipo “ah, é um remake então é ruim”. Claro que existem versões que ficaram terríveis, bem piores do que os originais (como foi o caso de Psicose) e remakes que são totalmente desnecessários (como foi o caso de Psicose), mas isso na impede de sair bons filmes com histórias que já foram mostradas antes.
Psicose, de 1998. Um remake desnecessário e chato.
Já falei que esse filme é ruim?
O único fator a mais que um remake deve ter além de um filme “não-remake” é o seguinte: deve haver um motivo para se fazer o remake. O diretor tem uma nova abordagem da história, acha que vale a pena fazer uma versão atualizada, ou com outro tipo de direcionamento, ou até mesmo quando se acha que, com as técnicas atuais, a história ficaria melhor.
Fazer por fazer, só porque conseguiu um ator da moda pra participar dele, ou porque o nome é forte (uma eventual “certeza” de atrair público), ou pra colocar um elenco adolescente ou algo assim, é uma receita pra fracasso. Mas, pensando bem, esses elementos fazem qualquer tipo de filme ficar ruim de doer, não?